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Calmas e furiosas: constante dicotomia |
Quando morava no litoral, sempre me encantava com o movimento das marés. O vai-e-vem das ondas, constantes e, ao mesmo tempo, inconstantes. Calmas em um momento e, noutros, com uma fúria sem limites e controle. Essa talvez seja a beleza que existe nos mares. Mas a ação jornalística também pode ser comparada ao que vivenciei.
Em tempos "líquidos" e de uma anunciada pós-modernidade, cada vez se torna mais difícil ensinar a ética jornalística. Essa é a conclusão que Stephen Ward é obrigado a reconhecer no artigo "
5 Principles for Teaching Journalism Ethics in the Digital Age", publicado no sítio
MediaShift. Ele é diretor do Center for Journalism Ethics in the School of Journalism and Mass Communications da Universidade de Wisconsin-Madison e, desenvolve atividades docentes constantes problematizando a ética em sala de aula.
Por que a dificuldade? Porque os padrões mudaram. Ward reconhece que em tempos passados os livros e manuais traziam conceitos de ética que eram repassados, em um verdadeiro cânon do "que fazer e do que evitar". Mais esses tempos "simples" já não existem mais. Para ele, há um choque entre o "velho" e o "novo" no campo da ética jornalística. O "velho" abrange questões amplamente discutidas em sala de aula, tais como o compromisso com o profissionalismo, a separação de notícias e opinião, os métodos para verificar os relatórios, uma preocupação com o rigor, e os ideais de objetividade.
Já o "novo", para muitos avassalador em seus métodos, invade o campo discursivo e profissional com elementos midiáticos diferenciados, tais como imediatismo, transparência, opinião crítica e jornalismo partidário, anonimato, levando muitos usuários a ignorar os métodos de precisão e verificação.
Essa constatação de Ward não é nova, mas vale lembrar que era de se esperar que novos usos fossem surgir das tecnologias que emergem e, que essas, provocassem uma crise nos paradigmas jornalísticos existentes.
Existe, então, do ponto de vista do ensino, um caminho para se ensinar ética jornalística em uma sociedade inconstante? Ward pensa que sim, mas envolve abandonar o consenso a priori. Ele indicou cinco elementos que todo professor de jornalismo deveria levar em consideração ao pensar seu curso. São eles:
1. Iniciar a partir da experiência vivencial que o aluno possui da mídia, isto é, discutir o que eles vivenciam, explorando o "tumulto de opiniões" sobre o jornalismo. Se você evitar isso, pode correr o risco de perder credibilidade aos olhos de seus alunos.
2. Auxiliar os estudantes a ter um envolvimento reflexivo: aqui entra a importância de servir de "ponte" entre o conhecimento e o alunado. O ponto central é dar-lhes elementos que permitam refletir, por conta própria, sobre os princípios, a medida em que o docente, vai mediando/intermediando com métodos para análise de situações éticas, dando perspectivas.
3. Insistir no desenvolvimento de um pensamento crítico, não nos modismos. Trabalhe contra a tendência de rejeitar princípios, simplesmente porque são tradicionais e parecem não estar na moda. Por exemplo, os "entusiastas" da nova mídia pode apressar-se a rejeitar a objetividade da notícia como um ideal. Eles podem usar raciocínios capciosos. Em tais situações, os professores têm de perguntar por razões melhor, para indicar as áreas onde a objetividade possa ser necessária, e para introduzir versões matizadas de objetividade que evitem as objeções mais óbvias.
4. Ser transitório. Ministre o curso para que seus alunos possam acompanhar a transição nas estruturas tradicionais e profissionais.Faça uma avaliação justa da ética no jornalismo profissional. Como surgiu e quais são suas características essenciais? Em seguida, compare esse quadro com os valores que fundamentam hoje a ética. A questão norteadora é: Até que ponto os princípios tradicionais se aplicam hoje? Que orientações editoriais são necessárias para lidar com situações novas, novos dilemas? Grande parte do ensino de ética jornalística deve envolver discussões sobre como a ética do jornalismo pode reinventar-se para que ela possa orientar jornalistas por meio de múltiplas plataformas midiáticas. Mostre que a invenção de novas orientações é possível. Examine como as organizações de notícias estão construiindo novas orientações sobre uma série de problemas, por exemplo, a partir do conteúdo cidadão verifique como lidar com os boatos na mídia social. Desafie-os a escrever a sua própria política de ética no anonimato online ou outros problemas.
5. Ser "global" em seu ensino. Com a "globalização" do jornalismo, exige-se que os alunos possam pensar sobre sua responsabilidade de informar um público que ultrapassa as fronteiras. Em um mundo de mídia em constante alternância, os alunos devem ponderar se os jornalistas precisam adotar uma visão mais global de si mesmos. Eles precisam considerar a possibilidade de uma ética do jornalismo global. Além disso, devemos ensinar a pluralidade de abordagens para a ética jornalística, que possa ser aplicada da Escandinávia e da Europa para a Ásia.
Essas indicações são importantes, pois permitem ao docente rever sua prática em sala de aula. Mas, Ward alerta algo que achei especialmente interessante. A revolução na sala de aula começa pelo próprio professor, sendo esse mais dialético, permitindo espaços para que seus alunos participem e construam pontos de vista; holístico, ajudando a eclosão de vários tipos de fatos e idéias nas discussões; e, socrático, por meio de questionamento e discussão, para que os alunos formulem seu próprio quadro ético.